sábado, 20 de setembro de 2014

Texto: Não é tempo de coroas e de prêmios, mas de lutas - Mc 10.32-45 (João Crisóstomo)


Não é tempo de coroas e de prêmios, mas de lutas



Mc 10.32-45

João Crisóstomo



Chegando Jesus a Jerusalém, aproximou-se dele a mãe dos filhos de Zebedeu, com seus filhos Tiago e João, dizendo-lhe: Dize que estes meus dois filhos se assentem um à tua direita e outro à tua esquerda (Mt 20.21). Outro evangelista (Mc 10.35) diz terem sido os filhos que fizeram esse pedido a Cristo. Mas não há desacordo, nem é o caso de nos determos nessas minúcias. Tendo mandado a mãe à frente, após ter ela falado e preparado o terreno, fizeram também o pedido, sem saber o que diziam. Na verdade, embora apóstolos, eram ainda muito imperfeitos, como filhotes de pássaros a girar em torno do ninho, antes de lhes nascerem as penas.

É muito útil sabermos que, antes da Paixão, estavam mergulhados em grande ignorância a ponto de censurá-los o Senhor, dizendo: Nem mesmo vós tendes entendimento? (Mt 15.16) Ainda não entendeis nem compreendeis (Mc 8.17) que não estava falando de pão quando vos disse: acautelai-vos do fermento dos fariseus? (Mt 16.11). E mais tarde: Tenho ainda muita coisa a dizer-vos, mas não sois capazes de compreender agora (Jo 16.12).

Não vemos que certamente nada sabiam da ressurreição? E o evangelista o acentua dizendo: Ainda não tinham compreendido que, conforme a Escritura, devia ressuscitar dos mortos (Jo 20.9). E se não sabiam isso, com mais razão ignoravam outras coisas, como, por exemplo, o que se refere ao reino dos céus, à nossa origem e ascensão ao céu. Ainda apegados à terra, não podiam elevar-se às alturas. Esperavam, convictos, que de um dia para o outro, reconstituisse ele o reino de Jerusalém, uma vez que não eram capazes de compreender outra coisa. Outro evangelista também o indica, afirmando que pensavam já estar próxima a vinda do reino, que imaginavam semelhante aos reinos terrenos, e acreditavam estar-se preparando para instaurá-lo e não para a cruz e para a morte. Não conseguiram compreender essas coisas apesar de as terem ouvido muitas vezes.

Não tendo, pois, chegado a um claro e exato conhecimento da verdade, acreditavam estar a caminho de um reino terreno, certos de que ele reinaria em Jerusalém. E estando perto dele, na estrada, aproveitaram a ocasião para dirigir-lhe tal pedido. Afastando-se do grupo dos discípulos, como se tudo dependesse de sua vontade, pedem-lhe um lugar privilegiado e que lhes fossem atribuídos cargos importantes. Achavam que as coisas chegavam a seu fim, que tudo estava terminado, e viera o tempo das coroas e dos prêmios. Era o cúmulo da ignorância.

Depois do pedido que fizeram, ouçamos a resposta de Jesus: Não sabeis o que pedis (Mt 20,22). Não era o momento de coroas e prêmios, mas de batalha, de luta, de fadigas, de suores, de provações e combates. A frase não sabeis o que pedis significa tudo isto. Ainda não experimentastes os cárceres, ainda não entrastes em campo para combater.

Podeis beber o cálice que eu vou beber, ou ser batizados com o batismo com que serei batizado? (Mc 10.38). Neste momento chama cálice e batismo à sua cruz e à sua morte. Cálice porque as bebe avidamente; batismo porque com elas purifica a terra. Não só deste modo a redimia, mas também pela ressurreição, que não lhe foi custosa. Do cálice que vou beber também bebereis, e com o batismo com que vou ser batizado, sereis batizados (Mc 10.39), diz ele, chamando assim à sua morte. Na verdade Tiago teve a cabeça cortada pela espada e João como que passou por várias mortes. Porém sentar à minha direita ou à minha esquerda, não me cabe concedê-lo, mas é para aqueles para quem foi preparado (Mc 10.40). Vós morrereis, sereis condenados à morte e obtereis a honra do martírio. Quanto a ser o primeiro, não me cabe concedê-lo, mas é para aqueles para quem foi preparado.

Fonte: Homilias de São João Crisóstomo

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